É consabido por todos que militam na área jurídica, que aberta a sucessão, a herança transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários. Esta regra está prevista no art. 1.784, do Código Civil e denomina-se droit de saisine.
Isto implica dizer que, diferentemente do que ocorre nas transmissões inter vivos, onde a transferência de bens imóveis se dá com o registro imobiliário, e a de bens móveis através da tradição, nas transmissões causa mortis é a própria morte que opera esta transferência, de forma automática e ininterrupta.
Com efeito, logo após a morte do pai, os seus filhos já se tornam donos de todos os bens do falecido pai. Não será o formal de partilha ou a escritura pública de inventário e partilha, ou a carta de adjudicação, que lhes outorgará esta condição, mas, sim, a própria morte do pai. Esta regra está prevista no art. 1.784 do Código Civil, que repete de forma mais abrangente o art. 1.572, do CC/16.
É importante atentarmos para um pequeno detalhe, esta transferência automática e ininterrupta somente se outorga aos herdeiros legítimos e testamentários, não se aplicando aos legatários, vide arts. 1.923 e 1.924, do Código Civil, posto que nos legados, o legatário tem desde a abertura da sucessão a propriedade do legado, mas a posse do mesmo depende da entrega que lhe deverá ser feita pelo herdeiro.
Outrossim, o inventário terá simplesmente a função de cumprir as formalidades tributárias e administrativas, para que os bens do falecido possam ser transferidos nos registros imobiliários e demais órgãos competentes, além do pagamento do imposto devido ao Estado.
No entanto, como já disse acima, a transmissão se deu pela morte. A função do magistrado no processamento do inventário e na partilha será meramente declaratória ou homologatória.
Existem duas regras do direito sucessório que são fundamentais para o seu correto e pleno entendimento, a primeira delas, é a que está prevista no art. 1.787, in verbis, “Regula a sucessão e a legitimação para suceder a lei vigente ao tempo da abertura daquela”. Esta regra é a chamada a “lei da data do óbito”.
Ou seja, será a lei da data do óbito que será aplicada para estipular qual será a ordem da vocação hereditária, o pagamento do imposto devido, além de eventuais outras questões que possam ser suscitadas.
A segunda regra basilar é que o falecido transmite exatamente aquilo que ele tinha ao falecer, isto é, se ele era proprietário, ele transmitirá a propriedade, se ele era posseiro, ele transmitirá a posse, se ele tinha o direito e ação, ele transmitirá o direito e ação.
Já diziam os romanos que ninguém pode transmitir mais direitos do que tem. Esta máxima romana prevalece no Direito Civil: nemo plus iuris transferre potest quam ipse habet.
A aquisição, in casu, é derivada, ou seja, ninguém pode adquirir um direito melhor do que aquele que tinha o seu autor.
INVENTÁRIO QUANDO HÁ DÉBITO FISCAL
O antigo CPC exigia a quitação dos tributos para a conclusão de um inventário, no caput e §2º, do art. 1.031, e no caput e §5º art. 1.036. No mesmo sentido, o art. 31, da Lei nº 6.830/80 (Lei de Execução Fiscal) e o art. 192, do CTN (admitindo-se apenas a certidão positiva com efeito de negativa, a teor do disposto no art. 206, do CTN).
O Código de Processo Civil de 2015 não prevê a prova da quitação dos tributos, vide art. 659, no entanto, exige que se reservem bens suficientes para o pagamento da dívida, por força no disposto no art. 663.
A meu ver, a exigência da reserva de bens torna inexequível o inventário extrajudicial, bem como tornará o inventário judicial ainda mais lento, haja vista que para que seja efetivada a reserva de bens, deverá obrigatoriamente ser procedida à avaliação judicial do mencionado bem ou bens.
Por outro lado, entendo que tal exigência é inconstitucional, tanto a da obrigatoriedade da quitação dos tributos, como a da reserva de bens (prevista no CPC/15), pelos idênticos motivos expostos em decisões recentes do STF sobre a exigibilidade da CND e dos Tributos Federais, ADI 394-1 e 173-6, para a execução de determinados atos.
Sucintamente, os fundamentos que embasaram a decisão do nossa Corte Suprema foram: a) violação ao direito fundamental ao livre acesso ao Poder Judiciário (inciso XXXV, do art. 5º, da CF/88); b) sanção política; c) violação ao devido processo legal; d) instrumento oblíquo de coação e de indução para cobrança de tributo.
Na hipótese do inventário e partilha de bens, entendo que além das fundamentações acima discriminadas, deveríamos aduzir a afronta ao dispositivo constitucional previsto no inciso XXIII, art. 5º, da CF/88, ou seja, a propriedade atenderá a sua função social.
É indubitável que um bem colocado fora do comércio não atenderá a sua função social e será prejudicial à economia do país.
A questão da função social da propriedade é tão fundamental, que à vista desses fundamentos, entre outros, o atual Código Civil, praticamente, aboliu o fideicomisso e restringiu severamente a cláusula de inalienabilidade.
De lege ferenda e com intuito de atender aos dois direitos, ora colidentes, ou seja, de um lado o Fisco e do outro o preceito constitucional, que determina que a propriedade deverá cumprir a sua função social, entendo que, ao lavrarmos um inventário em que haja débito fiscal, ao invés de impedirmos a conclusão deste, deveríamos oficiar ao Registro Imobiliário competente, para que se procedesse à averbação junto à matrícula do imóvel, da existência de débito fiscal, podendo o mencionado bem ou bens serem alienados livremente, mas com a ciência do comprador do risco que aquela transação representaria.
A propósito, o atual CPC, nos incisos I e II, do art. 792, determina que qualquer ação fundada em direito real ou com pretensão reipersecutória deverá ser averbada no respectivo registro imobiliário para que seja considerada fraude à execução, repetindo o previsto na Súmula nº 375, do STJ e prestigiando, cada vez mais, o princípio da concentração na matrícula.
E, para o cancelamento da averbação, as partes poderiam se dirigir novamente ao Tabelionato, para requererem o seu cancelamento, com a prova do pagamento do aludido tributo.
HABILITAÇÃO PROCESSUAL
Como devemos proceder se o falecido era autor ou réu numa demanda judicial?
E mais. Quando deveremos substituir a parte por seu Espólio ou por seus sucessores?
Esta situação será resolvida da seguinte forma: se o falecido não deixou nenhum bem, não haverá necessidade de se abrir um inventário negativo, para nomeação de inventariante ou nomeação de interessado, com poderes de inventariante, nos termos do art. 11, da Resolução CNJ nº 35/07, haja vista que os próprios herdeiros poderão habilitar-se no processo, que se encontra em curso.
Entretanto, se o falecido deixou outros bens, não haverá lugar para a habilitação dos herdeiros, mas sim, a substituição do falecido pelo seu respectivo espólio. E, caso o espólio venha a ser o vencedor da demanda e titular de um crédito, este crédito, provavelmente, deverá ser inventariado em sobrepartilha, por força do disposto no inciso II, do art. 669, do NCPC c/c art. 2.021, do CC/02.
Vale mencionarmos que a fundamentação legal do que foi dito acima se encontra no §1º do inciso VII, do art. 75, art. 110, inciso I, do §1º, do art. 313 c/c art. 689, inciso IX, do art. 485, arts. 687 a 692, inciso II, do art. 778 e art. 1.004, todos do NCPC.
Vejamos também o que determina a nossa jurisprudência:
PROCESSO CIVIL. AGRAVO. MORTE DO AUTOR. SUBSTITUIÇÃO PROCESSUAL. HABILITAÇÃO DOS HERDEIROS. – Agravo interno objetivando a reforma da decisão que negou seguimento ao agravo de instrumento e julgou prejudicado os embargos de declaração opostos às fls. 95 /96, mantendo a preferência à substituição pelo espólio, porquanto a habilitação dos herdeiros somente se dará em caso de inexistência de bens a inventariar, o que não é o caso, conforme verifica-se nas certidões de óbitos apresentadas. – “Embora no caso de morte do autor da ação seja efetuada a substituição processual pelo seu espólio, é admissível a simples habilitação dos seus herdeiros na hipótese de inexistência de patrimônio susceptível de abertura de inventário. (STJ, REsp 254180 / RJ , Sexta Turma, Rel. Min. Vicente Leal. DJ de 15/10/2004, p. 304).” Precedentes. – Negado provimento ao agravo interno.
(AG AGRAVO DE INSTRUMENTO AG 201002010129031 – TRF2, publicado 16/06/2011)
Se o falecido era réu, será habilitado o espólio até a partilha e, após, a legitimidade será de cada herdeiro pessoalmente. Nesse caso, cada herdeiro responderá até o limite do que herdou do de cujus.
Na hipótese do falecido ser autor, mas sendo objeto do processo direito personalíssimo e sem repercussão patrimonial, o processo será extinto.
CÔNJUGE NÃO É HERDEIRO
A Resolução nº 35/07, do CNJ, acertadamente, no seu art. 17, dispõe o seguinte:
“Art. 17. Os cônjuges dos herdeiros deverão comparecer ao ato de lavratura da escritura pública de inventário e partilha quando houver renúncia ou algum tipo de partilha que importe em transmissão, exceto se o casamento se der sob o regime da separação absoluta.”
Por conseguinte, ficou claro que somente quando houver na partilha de bens, renúncia ou cessão, é que deverá o cônjuge do herdeiro, dependendo ainda do regime de bens do casamento, firmar a partilha.
Claro! O cônjuge não é herdeiro!! Ele poderá ou não fazer jus aquele bem que ora está sendo inventariado em função do seu regime de bens, somente isso.
Então, não vejo razão para se exigir sempre a presença dos cônjuges, para que uma escritura pública de inventário e partilha de bens seja registrada.
DA RENÚNCIA EM FAVOR DO MONTE
Na Cidade do Rio de Janeiro, a Lei Estadual nº 7.174/15 determina que:
Art. 7º O imposto não incide:
I – quando houver renúncia pura e simples à herança ou ao legado, sem ressalva ou condição, desde que o renunciante não indique beneficiário ou tenha praticado ato que demonstre aceitação;
Nessa hipótese de renúncia em favor do monte, temos que ter em mente duas preocupações: a) se todos da mesma classe renunciarem em favor do monte, herdará a classe subsequente e por direito próprio (vide art. 1.811, do CC); b) se apenas um dos herdeiros renuncia, a sua parte acrescerá à dos demais herdeiros da mesma classe.
DOS TERMOS INADEQUADOS
Repetindo o que eu já havia escrito sobre os termos inadequados, com os quais, constantemente, nos deparamos, mormente, quando o assunto é inventário, é muito comum escutarmos que os filhos abriram mão da herança para a mãe.
Essa linguagem, contudo, tem cabimento numa conversa coloquial, entre pessoas que não tem conhecimento jurídico.
Todavia, esse linguajar é inservível para a confecção de um instrumento público. O correto é colocarmos que os filhos cederam os seus quinhões hereditários gratuitamente a sua mãe.
Outra forma equivocada e, também, recorrente, que encontramos nas escrituras é a renúncia ad favorem. Ora, renunciar em favor de determinada pessoa é doar ou ceder gratuitamente. A renúncia é um ato incondicional, apesar da lei estadual que trata desse assunto prever expressamente a renúncia em favor de determinada pessoa (vide art. 7º, da Lei Estadual RJ nº 7.174/15).
Data venia, abrir mão ou renunciar em favor de fulano de tal, não existe no mundo jurídico. O que existe é doar (quando se tem o domínio) e ceder (quando alienamos um direito) gratuitamente. A cessão poderá ser de direitos hereditários ou de meação.
CESSÃO DE DIREITOS HEREDITÁRIOS OU DE MEAÇÃO
A cessão de direitos hereditários ou de meação, seja de bens móveis ou imóveis, deverá ser feita por meio de escritura pública, posto que o direito à sucessão aberta é imóvel para efeitos legais, vide inciso II, do art. 80, do Código Civil.
Com efeito, vale lembrar, que a lavratura das escrituras de cessão de direitos hereditários de bem singular, sem que haja prévio alvará judicial, foi vedada pela nossa Corregedoria Geral de Justiça, por meio do Parecer CGJ nº SN160, de 11.07.2007, Procedimento nº 2006-324253, Relator Dr. Fábio Ribeiro Porto.
Conquanto eu discorde inteiramente do teor daquele parecer, esta proibição ainda continua vigente. Gostaria, inclusive, de sugerir a leitura do excelente artigo publicado pelo nosso colega, Eduardo Sócrates Castanheira Sarmento Filho, Oficial do Serviço Notarial e Registral do 1º Ofício de Volta Redonda, sobre esse tema, intitulado “Cessão de direitos hereditários sobre bem específico: Pode o tabelião lavrar a escritura?”.
DIREITO DE REPRESENTAÇÃO E PÓS FALECIMENTO
Outra questão importante é a seguinte: somente há o direito de representação quando ocorre o pré-falecimento do herdeiro e nas condições previstas no Código Civil (vide arts. 1.851 a 1.856, do CC/02).
Quando o herdeiro falece depois, não será a hipótese de representação. Aquele bem que está sendo inventariado deverá ser atribuído ao espólio do herdeiro falecido, pois, como disse no preâmbulo deste texto, a morte opera a transferência imediata e ininterrupta dos bens do falecido, logo se o pai faleceu e depois faleceu o filho, o quinhão do filho falecido deverá ser atribuído ao seu respectivo espólio.
Por sua vez, o Código de Processo Civil de 1973 admitia nos seus artigos 1.043 e 1.044, o inventário cumulativo, por uma questão de economia processual, que, a meu ver, em se tratando de inventário extrajudicial não se justifica.
O Novo Código de Processo Civil regula essa matéria nos arts. 672 e 673, sendo este bem mais abrangente que o anterior, à medida que permite a cumulação quando há identidade de pessoas, herança deixada pelos dois cônjuges ou companheiros e houver dependência de uma das partilhas em relação à outra.
COMUNICAÇÃO É ALIENAÇÃO
Segundo ensinamento de Pontes de Miranda, em seu Tratado de Direito de Família: “Dizer-se que os bens inalienáveis são comunicáveis é negar-se a própria inalienabilidade porque a comunicação é alienação. Quem aliena metade de um bem, aliena; quem se casa e do casamento resulta comunicação de metade do bem, também aliena. Não seria possível conceber-se comunicação sem alienação. Nem todos os bens incomunicáveis são inalienáveis, mas todos os bens inalienáveis são incomunicáveis.”1
DIREITOS AUTORAIS
O direito autoral é o único direito da personalidade que se transmite.
E, de acordo com o art. 3º, da Lei nº 9.610, de 19.02.1998, os direitos autorais reputam-se, para efeitos legais, bens móveis.
Outro dispositivo que nos interessa da Lei de Direito Autoral, é o art. 41, que prevê o seguinte:
“Art. 41 – Os direitos patrimoniais do autor perduram por setenta anos contados de 1º de janeiro do ano subsequente ao de seu falecimento, obedecida a ordem sucessória da lei civil.”
No que tange à proteção aos direitos patrimoniais sobre obras audiovisuais aplica-se o disposto no art. 44, o prazo será igualmente de 70 anos, no entanto, contado a partir de 1º de janeiro do ano subsequente ao de sua divulgação.
Vale, ainda, ressaltar o que determina o art. 49, da supracitada lei, que diz o que se segue adiante:
“Art. 49 – Os direitos do autor poderão ser total ou parcialmente transferidos a terceiros, por ele ou por seus sucessores, a título universal ou singular….”
Finalmente, em relação aos direitos autorais, apesar de não tratar de sucessão, entendo de suma importância mencionar o art. 39, da aludida lei, que diz o seguinte:
“Art. 39 – Os direitos patrimoniais do autor, excetuados os rendimentos de sua exploração, não se comunicam, salvo pacto antenupcial em contrário.”
POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DA LEI ESTRANGEIRA
Na hipótese de sucessão de bens de estrangeiro, caso estes estejam situados no Brasil, a sucessão se dá de acordo com a lei mais favorável aos herdeiros brasileiros, conforme determina o § 1º do art. 10, da Lei de Introdução ao Código Civil e o inciso XXXI, do art. 5º, da Constituição da República.
Lembre-se que a competência para lavratura de escrituras de inventário e partilha no Brasil restringe-se aos bens situados no território nacional, conforme disposto nos arts. 23 e 48, do NCPC, que tratam do inventário judicial, mas que se aplicam, igualmente, ao extrajudicial.
Frise, também, que o art. 29, da Resolução CNJ nº 35/07, prevê que:
“Art. 29. É vedada a lavratura de escritura pública de inventário e partilha referente a bens localizados no exterior“.
BENS ENFITÊUTICOS
A enfiteuse caracteriza-se como o mais amplo dos direitos reais em coisa alheia, posto que não há restrições ao titular do domínio útil ao exercício dos três poderes, uso (em razão do uso pode e deve utilizar-se da coisa); gozo (extração dos frutos e produtos do imóvel); e da disposição (pode onerar ou mesmo alienar a coisa).
Não há o pagamento do laudêmio nos casos de cessão gratuita do domínio útil ou de sucessão causa mortis (art. 681, do CC/16) ou ainda quando o próprio senhorio exerce o direito de opção (art. 683, CC/16).
INVENTÁRIO DE CRÉDITOS DA LEI nº 6.858/80 e DECRETO nº 85.845/81
De acordo com a supracitada lei, a sucessão de pequenos valores monetários dispensa inventário, independe de recolhimento tributário, aplicando-se a resíduos pecuniários de FGTS, PIS/PASEP, saldos de salários, rescisão trabalhista e restituição de IR, de qualquer valor, nos termos da Lei nº 6.858/80.
Como devemos proceder nesses casos?
O primeiro e mais importante passo é a habilitação prévia junto ao INSS. Para que a habilitação seja efetivada dever-se-á observar o que determina o §3º, do inciso III, do art. 22, do Decreto nº 3.048/00 e art. 16, da Lei nº 8.213/91.
Ou seja, após o falecimento do segurado, o dependente previamente habilitado deverá requerer junto ao INSS a certidão de habilitação como dependente.
Esta certidão de habilitação como dependente será o documento legalmente previsto para legitimar o saque das contas vinculadas de titular falecido (inciso IV, do art. 20, da Lei nº 8.036/90), vide também art. 112, da Lei nº 8.213/91, independentemente do recolhimento do tributo e do inventário.
Vejamos, então, o que dispõe o TRF 5 – Apelação Cível AC 360974 PE 2002.83.00.019455-1, a seguir:
FGTS. PIS. FALECIMENTO DO TITULAR. DEPENDENTE. CERTIDÃO DO INSS. LEVANTAMENTO DE VALORES. POSTERIOR HABILITAÇÃO DE NOVOS DEPENDENTES. CONDENAÇÃO DA CAIXA A NOVO PAGAMENTO. IMPROCEDÊNCIA. RECURSO NEGADO.
1. Não há que se falar em imputação de responsabilidade à Caixa pelo levantamento da totalidade dos valores depositados em contas vinculadas ao FGTS e PIS por dependente de titular que, antes dos demais legitimados para o recebimento, apresenta certidão do INSS como único habitado a tanto.
2. A certidão de habilitação como dependente, junto ao INSS, é o documento legalmente previsto para legitimar o saque das contas vinculadas de titular falecido (art. 20, IV, Lei 8.036/90).
3. Assim, cumpridas as formalidades legais, o levantamento da totalidade de tais valores por apenas um dos dependentes, em prejuízo dos posteriormente habilitados a tanto, não legitima a pretensão deduzida pelos dependentes preteridos contra a CEF.
4. Hipótese em que a parte autora deveria, em ação própria, direcionar sua irresignação a quem indevidamente apropriou-se do que não lhe pertencia, ou seja, quem primeiro compareceu para efetuar os saques em questão.
(negrito e sublinhado acrescentados)
Outros exemplos da nossa legislação, no que tange à Lei nº 6.858/80, que se seguem abaixo:
LC nº 26 de 1975 – Altera disposições da legislação que regula o Programa de Integração Social (PIS) e o Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público (PASEP).
Art. 4º – As importâncias creditadas nas contas individuais dos participantes do PIS-PASEP são inalienáveis, impenhoráveis e, ressalvado o disposto nos parágrafos deste artigo, indisponíveis por seus titulares.
§ 1º – Ocorrendo casamento, aposentadoria, transferência para a reserva remunerada, reforma ou invalidez do titular da conta individual, poderá ele receber o respectivo saldo, o qual, no caso de morte, será pago a seus dependentes, de acordo com a legislação da Previdência Social e com a legislação específica de servidores civis e militares ou, na falta daqueles, aos sucessores do titular, nos termos da lei civil.
Lei nº 8.036 de 1990 – Dispõe sobre o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, e dá outras providências.
“Art. 20. A conta vinculada do trabalhador no FGTS poderá ser movimentada nas seguintes situações:
(…)
IV – falecimento do trabalhador, sendo o saldo pago a seus dependentes, para esse fim habilitados perante a Previdência Social, segundo o critério adotado para a concessão de pensões por morte. Na falta de dependentes, farão jus ao recebimento do saldo da conta vinculada os seus sucessores previstos na lei civil, indicados em alvará judicial, expedido a requerimento do interessado, independente de inventário ou arrolamento;”
Lei nº 8.213 de 1991 – Dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social e dá outras providências.
“Art. 112. O valor não recebido em vida pelo segurado só será pago aos seus dependentes habilitados à pensão por morte ou, na falta deles, aos seus sucessores na forma da lei civil, independentemente de inventário ou arrolamento.”
Por outro lado, a mencionada lei, no seu art. 2º, estende a sua aplicação aos saldos bancários e de contas de cadernetas de poupança e fundos de investimento. No entanto, estabelece duas condições para que seja implementada a sua abrangência: a) não existir outros bens sujeitos a inventário; b) valor até 500 OTN’s.
O valor de 500 OTN’s será calculado da seguinte forma:
“50 ORTN = 50 OTN = 308,50 BTN = 308,50 UFIR = R$ 328,27 (trezentos e vinte e oito reais e vinte e sete centavos) a partir de janeiro/2001 quando foi extinta a UFIR e desindexada a economia”.
Portanto, em janeiro/2001, a ORTN seria R$328,27/50 = R$6,57.
500 ORTN seriam R$ 3.285,00 em janeiro de 2001.
Como o acórdão diz que extinta a UFIR pela Medida Provisória nº 1.973/67, de 26.10.2000, convertida na Lei nº 10.552/2002, o índice substitutivo utilizado para a atualização monetária dos créditos do contribuinte para com a Fazenda passa a ser o IPCA-E, divulgado pelo IBGE, na forma da resolução 242/2001 do Conselho da Justiça Federal, atualizei no cálculo abaixo o valor de R$ 3.285,00 pelo IPCA-E para hoje.
Ou seja, hoje vale aproximadamente R$ 9.243,10 (nove mil, duzentos e quarenta e três reais e dez centavos).
Vejam, também, o teor do acórdão proferido pela nossa Egrégia 16ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, sendo relator o eminente Desembargador, Carlos José Martins Gomes.
” Agravo de instrumento. Pedido de alvará para o levantamento de restituição de imposto de renda deixada pela mãe da requerente, sendo a mesma a única herdeira, com fundamento no artigo 2º da Lei 6858/1980. Decisão agravada que determinou a emenda da inicial para pedido de sobrepartilha, pelo rito de arrolamento sumário, tendo em vista a prévia partilha extrajudicial, bem como porque o valor existente em nome da finada ultrapassa o limite legal. Lei 6858/1980 que autoriza o levantamento de valores de contas de FGTS, PIS/PASEP, restituições de Imposto de Renda, bem como de saldos bancários e de contas de cadernetas de poupança e fundos de investimento, pelos dependentes previdenciários ou sucessores dos respectivos titulares, independentemente de inventário ou arrolamento. Inclusive, mesmo diante da prévia abertura de inventário ou arrolamento, não há óbice para o procedimento em tela. Legislação que não impõe limitação no caso de alvará para levantamento de restituição de imposto de renda. Provimento do recurso, na forma do disposto no artigo 557, § 1º A, do Código de Processo Civil.”
(Agravo de instrumento nº 0042386-55.2014.8.19.0000, 16º CC TJRJ,
Relator Des. Carlos José Martins Gomes, Agravante Marisa Rodrigues Teixeira Leite)
Como fazer para o dependente não habilitado?
O dependente não habilitado deve obter do INSS uma certidão negativa de habilitação, que nada mais é do que a informação por escrito de que o falecido não deixou dependentes habilitados junto ao INSS.
De posse dessa certidão, os créditos trabalhistas (verbas decorrentes da resolução do contrato pela morte) e a movimentação da conta-vinculada de FGTS deverão ser pleiteados junto à Justiça do Trabalho, que condenará o empregador a realizar os pagamentos e expedirá alvará à CAIXA para levantamento dos valores constantes na conta vinculada do FGTS.
Nesse caso, o inventariante, representando o Espólio ou o procurador com poderes de inventariante (art. 11, da Resolução CNJ nº 35/07), na hipótese do inventário ser extrajudicial, deverá requerer o levantamento das supracitadas quantias.
Os valores referidos no artigo 2º da Lei deverão ser requeridos ao juízo orfanológico, por meio de alvará ou de inventário, dependendo da hipótese.
Sendo que, nos casos acima previstos, determina o art. 1.037, do Código de Processo Civil de 1973, que foi repetido, ipsis litteris, pelo Novo Código de Processo Civil no seu art. 666, que o levantamento dessas quantias independerá de inventário ou arrolamento.
POSSIBILIDADE DE ELEIÇÃO DA VIA EXTRAJUDICIAL NA HIPÓTES DE TESTAMENTO REVOGADO, CADUCO, INVÁLIDO OU CUMPRIDO.
Como se sabe, para a realização do inventário na via extrajudicial todos os herdeiros devem ser capazes e concordes quanto à partilha dos bens e o falecido não pode ter deixado testamento.
Não obstante, de acordo com a nova redação dos §§ 1°, 2° e 3°, do art. 297, da Consolidação Normativa da Corregedoria Geral da Justiça/ TJRJ– Parte Extrajudicial, será permitida a lavratura de escritura de inventário e partilha nos casos de testamento revogado ou caduco, quando houver decisão judicial, com trânsito em julgado, declarando a invalidade do testamento ou diante da expressa autorização do juízo sucessório competente, nos autos da ação de apresentação e cumprimento de testamento.